II Domingo do Advento (Ano C) - "Maravilhas fez conosco o Senhor"

02 diciembre 2021

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Primeira leitura
Bar 5,1-9
Deus mostrará seu esplendor.

Salmo responsorial
Salmo 125
Grandes maravilhas fez por nós o Senhor

Segunda leitura
Filip 1,4-6.8-11
Que vos torneis puros e irrepreensíveis para o dia de Cristo

Leitura do Evangelho
Lc 3,1-6
Toda a criatura verá a salvação de Deus

 

COMENTÁRIO BÍBLICO-MISSIONÁRIO

"Maravilhas fez conosco o Senhor"

Prosseguindo o caminho “em antecipação à sua vinda”, as leituras e orações litúrgicas deste segundo Domingo do Advento oferecem o material para refletir ainda mais sobre a esperança cristã e para intensificar o empenho especial que dela deriva neste período. Neste contexto, uma figura é indicada para todos nós como exemplo de vida totalmente imersa na preparação para a vinda do Senhor. É sobre João Batista, o precursor, “profeta do Altíssimo” (Lc 1,76) que será chamado pelo evangelista João de “un homem enviado por Deus” (cf. Jo 1,6), ele é, portanto, o missionário, enviado por Deus para dar testemunho da luz que é Cristo, Verbo feito homem (cf. Jo 1,7-8). Um exemplo sublime de como testemunhar Cristo e preparar o seu caminho no povo, permanecerá sempre para os discípulos-missionários de Cristo hoje, para uma expectativa ativa da sua vinda.

A partir da passagem sucinta do Evangelho de hoje, as características do “missionário” João Batista podem ser vistas através de três expressões-chave concentradas em um verso e meio da apresentação do protagonista: “a palavra de Deus foi dirigida a João”, “ele percorreu toda a região”, e “pregando um batismo de conversão” (Lc 3,2b-3).

1.A palavra de Deus foi dirigida a João”. O início das atividades de João Batista é apresentado pelo evangelista Lucas de forma muito solene, e a fórmula mais importante, é justamente aquela que sublinha a origem divina das atividades do Batista: “A palavra de Deus foi dirigida [literalmente veio] a João”. Esta é a expressão encontrada no relato da vocação de profetas como Jeremias (cf. Jr 1,2, e mesmo literalmente na versão grega da LXX de Jr 1,1) e Ezequiel (cf. Ez 1,3). É quase a fórmula de investidura profética: A Palavra de Deus [/ do Senhor] foi [/ aconteceu / veio] sobre o profeta e o enviou para começar a transmitir ao povo o que ele ouviu de Deus. Todo profeta de Deus é, portanto, seu enviado especial ao povo para falar sempre em nome de Deus e das coisas que Deus pede que digam! Ele é o missionário de Deus. Assim também aconteceu com João Batista, solenemente apresentado como o profeta eleito na plenitude da história que então será louvado pelo próprio Jesus como “o maior dos nascidos”, “mais que profeta”, “o mensageiro” de Deus (cf. Lc 7,27-28; Mt 11,9-11). E a menção particular do “deserto” como lugar de vocação e início das atividades do Batista não serve apenas para marcar o cumprimento do anúncio profético de Isaías (cf. Lc 3,4; Is 40,3) ou para recordar a experiência do êxodo, mas também para nos fazer imaginar um quadro espiritual geral da época e intuir uma ligação entre a entrada em cena de Batista e a renovação escatológica do povo. O profeta missionário de Deus quase sempre atua no deserto, mesmo quando o faz em uma cidade superpovoada como Xangai, Nova Delhi, Lagos ou São Paulo! O facto, porém, não o amedronta nem o desanima, porque sabe que não está ali por vontade própria, mas para uma missão que lhe é confiada pela Palavra de Deus!

2.Ele percorreu toda a região do Jordão”. Mesmo que o verbo original grego signifique “veio”, sua tradução portuguesa com “percorreu” faz bem a ênfase que o Evangelista São Lucas quer dar à característica das atividades do Batista com a precisão particular do local: “ toda a região do Jordão”, com destaque para “toda”. Sabemos que o Batista realmente desenvolve suas atividades ao redor do rio Jordão, onde pode administrar o batismo, ou seja, a imersão em água. Não há mais pistas linguísticas ou palavras mais claras, portanto, parece-nos que aqui São Lucas quis descrever a ação de Batista como a de um itinerante, quase segundo o modelo de Jesus (cf. Mc 1,39; Mt 4,23) e dos seus discípulos, os quais, enviados por ele para a missão, percorrerão todas as cidades e lugares para se preparar para a visita do seu Mestre (cf. Lc 10, 1).

A visão lucaniana da itinerância do Batista é altamente sugestiva e esclarecedora de uma perspectiva missionária. Todo profeta missionário de Deus é chamado a nunca ficar estático, mas dinâmico: é chamado a “percorrer”, a ir sempre lá, para onde a Palavra de Deus o envia. Assim como João Batista cumpriu sua “saída” e percorreu constantemente toda a zona para preparar “o caminho do Senhor” todo cristão é também chamado a sair e ser o Precursor missionário de Cristo em todos os lugares (mesmo fora de sua terra natal!), e especialmente neste tempo de espera da vinda do Senhor. Ajudemo-nos assim, em todos os lugares onde estejamos, a preparar-nos da melhor forma para acolher Cristo quando Ele vier.

3. “[Ele percorreu toda a região do Jordão] pregando um baptismo de conversão para o perdão dos pecados”. A apresentação das ações de João Batista no modelo cristão atinge seu clímax aqui. Com efeito, a sua “pregação” do baptismo de conversão aqui (Lc 3,3) encontra eco na descrição das actividades de Jesus e dos seus Apóstolos. Tanto que, depois, São Lucas não hesitou em resumir todas as ações de João Batista com uma frase significativa: “E ainda de muitos outros modos, João anunciava ao povo a Boa-Nova” (Lc 3,18). A “pregação” e a “evangelização” (anunciar a Boa-Nova) são as ações realizadas pelo próprio Cristo e pelos seus discípulos por ele enviados (cf. Lc 4,18-19; Mc 1,14-15; Mt 4,23). Mesmo o conteúdo da pregação e sua “evangelização” que visa a conversão (metanóia) e a remissão dos pecados, assemelha-se ao proclamado por Cristo (cf. Lc 5,32; Mc 1,15) e posteriormente pelos Apóstolos (cf. At 2,38), com a única diferença de que o último insistia na realização real do Reino de Deus e no dom do Espírito Santo. O Batista, portanto, em Lucas, mostra-se o único profeta de Deus que ao mesmo tempo já é um missionário “cristão”. É do seu “grito” que cada cristão missionário de hoje poderá extrair um aspecto útil para a sua vida e missão.

Enquanto insiste na necessidade de uma preparação séria para o Senhor que certamente virá para julgar o mundo, a mensagem de João Batista é essencialmente uma mensagem de esperança. Esta mensagem, aliás, é sublinhada em todos os profetas do Antigo Testamento, em particular na passagem de Baruc escolhida para a primeira Leitura que convida Jerusalém a deixar a veste de luto e de aflição para acolher o Deus que “guiará Israel, com alegria, à luz de sua glória, manifestando a misericórdia e a justiça que dele procedem”. Isso é destacado pelo Evangelista São Lucas com a citação sobre o cumprimento especial dos antigos oráculos do profeta Isaías com o ápice na afirmação final que ouvimos no Evangelho deste Domingo: “todas as pessoas verão a salvação de Deus!” (Lc 3,6; cf. Is 40,5). Esta afirmação, que soa literalmente “cada carne (sarx) verá a salvação de Deus”, destaca o universalismo da graça divina, tema tão caro a São Lucas. Por outro lado, está ligada à Pessoa de Jesus que se revelou como a “salvação de Deus” (cf. Lc 2,30; também At 28,28).

Perante a vinda de Jesus, a salvação de Deus, é certamente necessário um compromisso nada trivial de preparação interior e exterior, profetizado com as imagens sugestivas da construção da “estrada” que correspondem a ações morais e sociais concretas, explicitadas pelo próprio Baptista, na passagem seguinte do Evangelho de Lucas, sobre a qual meditaremos no próximo Domingo. Por enquanto, o que nos chama a atenção é a forma peculiar das frases sem a indicação do protagonista: “Todo vale será aterrado, toda montanha e colina serão rebaixadas;”. Por quem então essas coisas serão feitas? Obviamente, do imperativo anterior “endireitai suas veredas”. Os homens são legitimamente percebidos como aqueles que realizam essa ação. No entanto, a construção de verbos passivos normalmente implica Deus como o agente implícito. E então sob a ação divina, ao invés da obra humana, “as passagens tortuosas ficarão retas e os caminhos acidentados serão aplainados”, como confirma o profeta Baruch na primeira Leitura: “Deus ordenou que se abaixassem todos os altos montes e as colinas eternas, e se enchessem os vales, para aplainar a terra”. O milagre das ruas direitas e niveladas, das “estradas” no deserto, pertence sobretudo à graça de Deus que, em todo o caso, pede a colaboração de um homem de coração aberto para o acolher.

E esta é a mensagem, na verdade a boa nova, o Evangelho, a ser anunciado pelo Batista junto com todos os profetas enviados pelo Senhor. Esta será também a mensagem que todo cristão, profeta missionário de Cristo, fará ressoar ainda agora, especialmente no mundo de hoje, cheio de estradas tortuosas e inacessíveis, ravinas, montanhas, colinas. Como nos lembra o Papa Francisco, não é o momento de condenar, mas de proclamar sempre e a todos um “ano da graça” (Lc 4,19) de Deus “grande e misericordioso”, e isto apesar e talvez precisamente porque esta “geração corrompida e depravada” (Fil 2,15) continua a viver como se Deus não existisse. Em última análise, “Deus tanto amou o mundo que deu o seu Filho Unigênito […] Deus enviou o seu Filho ao mundo, não para condenar o mundo, mas para que este fosse salvo por meio dele.” (Jo 3,16-17). E todos nós, cristãos, somos então enviados por Cristo como o Pai o enviou. Ainda anunciamos sem cansaço, como o precursor de Cristo, a mensagem de esperança de amor e misericórdia de Deus que está por vir. E anunciemo-lo primeiro a nós próprios e depois aos demais, para que todos possamos nos preparar da melhor maneira para acolher o Senhor que vem com a sua graça.

 

Percepções úteis:

“Confiaremos a vida da Igreja, a humanidade inteira e o universo imenso à Realeza de Cristo, para que derrame a sua misericórdia, como o orvalho da manhã, para a construção duma história fecunda com o compromisso de todos no futuro próximo. Quanto desejo que os anos futuros sejam permeados de misericórdia para ir ao encontro de todas as pessoas levando-lhes a bondade e ternura de Deus! A todos, crentes e afastados, possa chegar o bálsamo da misericórdia como sinal do Reino de Deus já presente no meio de nós”. (Papa Francisco, Misericordiae Vultus, Bula de proclamação do Jubileu Extraordinário da Misericórdia, n. 5)

 

“A Igreja tem a missão de anunciar a misericórdia de Deus, coração pulsante do Evangelho, que por meio dela deve chegar ao coração e à mente de cada pessoa. A Esposa de Cristo assume o comportamento do Filho de Deus, que vai ao encontro de todos sem excluir ninguém. No nosso tempo, em que a Igreja está comprometida na nova evangelização, o tema da misericórdia exige ser reproposto com novo entusiasmo e uma acção pastoral renovada. É determinante para a Igreja e para a credibilidade do seu anúncio que viva e testemunhe, ela mesma, a misericórdia. A sua linguagem e os seus gestos, para penetrarem no coração das pessoas e desafiá-las a encontrar novamente a estrada para regressar ao Pai, devem irradiar misericórdia”. (Papa Francisco, Misericordiae Vultus, Bula de proclamação do Jubileu Extraordinário da Misericórdia, n. 12)

 

“A primeira missão foi confiada do Pai Eterno ao Seu Filho Unigênito, quando O enviou do céu para redimir o mundo. Nosso Senhor fala sempre sobre si mesmo como Aquele que foi enviado pelo Pai”.(Paolo Manna, La conversione del mondo infedele, Milano 1920, p. 15)